sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Os atos da Administração. Uma análise objetiva para concursos

Os atos da Administração. Uma análise objetiva para concursos

1. INTRODUÇÃO
Este artigo aborda os pontos distintivos entre ato administrativo e ato da Administração a partir da análise dos conceitos dados pela doutrina à primeira espécie de ato.
Relacionando tais conceitos à função administrativa exercida dentro do contexto da noção estrita de ato administrativo, afastamos a idéia segundo a qual todo ato praticado no exercício da função administrativa é ato da Administração.
Passamos, então, a explorar a proposta aqui sugerida.
2. CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO E A ANÁLISE DO ATO DA ADMINISTRAÇÃO NA DOUTRINA
Ato da Administração e ato administrativo são conceitos que não se confundem.
Desde já, a precisa lição de Celso Antônio Bandeira de Mello revela a diferença:
    ... A noção de ato administrativo não deve depender, isto é, não deve ser tributária, da noção de Administração Pública (conjunto de órgãos do Poder Executivo, autarquias e demais sujeitos da Administração indireta), porque, de um lado, nem todo ato da Administração é ato administrativo e, de outro lado, nem todo ato administrativo provém da Administração Pública”[1]
Perscrutando-se o tema com mais detença, podemos extrair a distinção entre um e outro a partir dos conceitos de ato administrativo dados pela doutrina:
    Ato administrativo é uma manifestação de vontade funcional apta a gerar efeitos jurídicos, produzida no exercício da função administrativa”[2]
    É a exteriorização da vontade de agentes da Administração Pública ou de seus delegatários, nessa condição, que, sob regime de direito público, vise à produção de efeitos jurídicos, com o fim de atender ao interesse público”[3]
    Declaração do Estado (ou de quem lhe faça as vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por órgão jurisdicional”[4]
Independentemente dos conceitos formulados pelos autores acima nominados e por outros de renomada, que também operam na seara do direito administrativo, emergem dois aspectos de importância crucial para distinção entre atos administrativos e atos da Administração.
O primeiro deles concerne ao sujeito.
Em relação ao sujeito, Celso Antônio Bandeira de Mello ressalta que “há atos que não são praticados pela Administração Pública, mas que devem ser incluídos entre os atos administrativos, porquanto se submetem à mesma disciplina jurídica aplicável aos demais atos da Administração, habitualmente reputados como atos administrativos”[5]
Diversamente dos atos da Administração Pública, que, com o perdão da tautologia, só podem ser praticados pela própria Administração Pública, os atos administrativos também podem ser praticados por aqueles que lhe façam as vezes.
Isso se dá porquanto o ato administrativo é produzido no desempenho de função administrativa, cujo exercício, em muitos casos, é atribuído a particulares que são delegatários de serviço público.
Embora atribuída o desempenho a particulares, a função administrativa que lhes foi delegada submete-se ao regime jurídico de direito público.
O segundo aspecto que desnuda a dessemelhança entre ato administrativo e ato da Administração é justamente o regime ao qual está submetido o primeiro, isto é, os atos administrativos, necessariamente, submetem-se ao regime jurídico de direito público, não se lhes aplicando o regime jurídico de direito privado.
Dessa submissão ao regime jurídico de direito público, deflui-se que aos atos administrativos atribuem-se todas as prerrogativas e, consequentemente, todas as restrições inerentes ao Poder Público.
Todavia, os atos da Administração, sobre poderem sujeitar-se ao regime de direito privado, também podem ser identificados em situações outras que não se vinculam ao exercício da função administrativa, considerando a acepção estrita de ato administrativo.
A respeito do exercício da função administrativa que se vincula ao conceito de ato administrativo em sentido estrito, o escólio percuciente de Weida Zancaner:
Ademais, a expressão ‘ato administrativo’ pode ser usada em sentido amplo e em sentido estrito. Em sentido amplo serve para abarcar os atos praticados no exercício da função administrativa que têm regime jurídico semelhante, quais sejam: os atos unilaterais gerais, os atos unilaterais concretos e os chamados contratos administrativos. Por sua vez, a mesma expressão, quando utilizada em sentido estrito, serve para designar apenas os atos unilaterais concretos expedidos no exercício da função administrativa, buscando, pois, uma semelhança ainda maior quanto ao regime jurídico que se lhes aplica[6].
Assim, conforme a preleção de Celso Antônio Bandeira de Mello, “a Administração Pública pratica inúmeros atos que não interessa considerar como atos administrativos, tais:
    a) Atos regidos pelo Direito Privado, como, por exemplo, a simples locação de uma casa para nela instalar-se uma repartição pública. O Direito Administrativo só lhes regula as condições de emanação, mas não lhes disciplina o conteúdo e correspondentes efeitos.
        (...)
        b) Atos materiais, tais o ministério de uma aula, uma operação cirúrgica realizada por médico no exercício de sua atividade como funcionário, a pavimentação de uma rua, etc. Por não serem sequer atos jurídicos, também não há interesse em qualificá-los como atos administrativos. Esses comportamentos puramente materiais da Administração denominam-se ‘fatos administrativos’.
        c) Atos políticos ou de governo, praticados com margem de discrição e diretamente em obediência à Constituição, no exercício de função puramente política, tais o indulto, a iniciativa de lei pelo Executivo, sua sanção ou veto, sub color de que é contrária ao interesse público, etc. Por corresponderem ao exercício da função política e não administrativa, não há interesse em qualificá-los como atos administrativos, já que sua disciplina é peculiar. Inobstante também sejam controláveis pelo Poder Judiciário são praticados de modo amplamente discricionário, além de serem expedidos em nível imediatamente infraconstitucional – ao invés de infralegal -, o que lhes confere fisionomia própria...”[7]
Nesse contexto, discordamos da eminente jurista Maria Sylvia Zanella Di Pietro, segundo a qual “todo ato praticado no exercício da função administrativa é ato da Administração”[8].
Isso porque a acepção estrita de ato administrativo serve para designar apenas os atos unilaterais concretos expedidos no exercício da função administrativa. Nem todo ato exercido na função administrativa é ato da Administração, particularmente se essa função é desempenhada no contexto da acepção estrita de ato administrativo.
Desse modo, levando em consideração a diferença conceitual proposta neste trabalho, o ato unilateral concreto expedido na função administrativa não é ato da Administração, mas sim ato administrativo em sentido estrito.
3. CONCLUSÃO
Recapitulando os termos desta exposição, reforçamos a distinção entre ato administrativo e ato da Administração, enfatizando a diferença entre um e outro, sobretudo a partir da análise dos aspectos relacionados ao sujeito e ao regime jurídico aplicável, negando, outrossim, que todo ato praticado no exercício da função administrativa é ato da Administração.
NOTAS E REFERÊNCIAS
[1] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 18ª edição, Malheiros, São Paulo, 2005, p. 356.
[2] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo, 4ª edição, Saraiva, São Paulo, 2009, p. 273.
[3] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 12ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 91.
[4] Op. Cit., p. 356.
[5] Op. Cit., p. 356.
[6] ZANCANER, Weida. Da convalidação e da invalidação dos atos administrativos, 3ª edição, Malheiros, São Paulo, 2008, p. 29.
[7] Op. Cit., ps. 355-356.
[8] Op. Cit., p. 182.

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